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Desigualdade e Reforma

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Estudo coletivo sobre Desigualdade Mundial 2018, sob a etiqueta do consagrado economista francês, Thomas Piketty (O Capital no Século XXI), fez as análises comparativas sobre os quadrantes da economia do planeta. As dificuldades analíticas são óbvias, pela excessiva diversidade das fontes primárias dos dados utilizadas, mas não invalidam de forma alguma as conclusões apresentadas. Sem nenhuma surpresa, o Brasil aparece, “ hors concours “, disparado na primeira colocação da desigualdade de renda dentre seus cidadãos. O 1% mais rico dos brasileiros detém quase 30% da renda nacional ( 28,7% ), seguido de longe pela Turquia na segunda colocação ( 21% ). O Brasil figura em situação bem pior de que os sultanatos árabes do Oriente Médio e da tribal África Subsaariana.


Quando o parâmetro de comparação vai para os 10% mais ricos da população, o Brasil perde a hegemonia absoluta e aninha-se na segunda colocação, de par com a Índia e suas castas. Ao que parece, abandonou-se o status de Belíndia 2.0, do brilhante livro do economista Edmar Bacha, para acomodação e fixação final no original de Índia pura e sem mistura, mesmo.

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A idoneidade intelectual impede de olvidar que a pesquisa inclui um período particularmente desfavorável na economia brasileira representado pelo vai e vem recessivo do período Dilma Roussef (e o monumental desemprego coletado enquanto resultante) e o baixo crescimento do curto período Temer (mesmo que ele tenha evitado o pior: a transformação de recessão aguda em depressão). Obviamente, aqui não é o espaço para discutir as razões da desigualdade que deslustra a alegria nacional. Por certo, razões de natureza histórica e políticas continuadas de exclusão dos simples e comuns do banquete da renda nacional têm sua responsabilidade em oferecer quadro de tamanha iniquidade.


O foco, aqui, terá de ser o papel do Estado brasileiro “ lato sensu “ e sua deformidade congênita em teimar em apresentar-se como um Robin Hood, às avessas, roubando dos pobres para doar aos ricos. O Estado brasileiro está menos para o Leviatã hobbesiano e mais para o cruel Moloch amonita no sacrifício de seus filhos.


As máquinas estatais brasileiras se apropriam de 4 dentre cada 10 reais de riqueza produzidos no país pelos agentes econômicos, sob a forma de tributos, e são pouco respeitadas as contrapartidas que elas oferecem aos cidadãos em educação, saúde e segurança pública, para mencionar-se apenas as funções de estado mais clássicas.


É certo que historicamente as estruturas estatais brasileiras socorrem, via erário, as frações hegemônicas das classes dominantes locais, através de mecanismos de desonerações, permissão e estímulo à cartelizações, créditos altamente subsidiados, isenções fiscais, apoios a campeões nacionais, privatização de lucros e socialização de prejuízos etc.


Mas as participações estatais não param por aí. O próprio estado em suas instâncias diversas criou uma casta bastante onerosa de privilegiados comensais que passaram a compor os segmentos dominantes do ápice da pirâmide dirigente do país; criou-se uma nova nobreza, uma nova corte sem monarquia central no Brasil. Na Índia, essa nova nobreza voraz e perdulária seria chamada de casta brâmane.


Dos 2.070.000 (dois milhões e setenta mil) brasileiros que compõem o 1% (um por cento) donos de 28,7% da renda nacional, além dos empresários bem sucedidos, também há a participação de membros dessa casta nobre espalhados pelos três poderes nas esferas federal, estaduais e municipais. Os que não forem da casta de mais elevada linhagem, do alto baronato, pertencem aos 10% que se apropriam de 55% da riqueza do país, conforme os estudos coordenados por Piketty. E são esses privilegiados das corporações os mais ferrenhos adversários da Reforma da Previdência.


Cresce na Camara Federal um feixe infeliz de ideias de retirar os Estados e Municípios das decisões da Reforma da Previdência em tramitação naquela Casa. Estados e Municípios ( o Brasil possui 17 áreas urbanas acima de um milhão de habitantes ) respondem por 96 bilhões de reais do déficit anual geral da Previdência Social.


Se este desatino vier a ocorrer, significará a pá de cal no sepultamento da Reforma e a garantia de um longo período de estagnação da renda “ per capita “ do brasileiro.


Imagine-se a torre de Babel que seria (ou será) a submissão da Reforma da Previdência à correlação de forças internas das Assembleias Legislativas Estaduais e Câmaras Municipais Brasil afora, com as corporações armadas e desarmadas aboletadas em suas galerias.


E o que não chega a ser a ser edificante é que a tal “ nova política “, pelo menos em parte, está no DNA dessa ideia infeliz: o líder do partido do Governo na Câmara Federal, Deputado Delegado Valdir (PSL-Go), é um dos maiores entusiastas desse desmembramento obsceno.


De resto, o Governo Bolsonaro carrega imensa carga de incertezas, de imprevisibilidades, de inseguranças e de falta de horizontes conhecidos, ou seja, de tudo que está na contramão da alma de uma economia pulsante e inovadora. Não é à toa que ela tenha empacado, que esteja travada e flertando com o fantasma de uma recessão técnica. Sem uma Reforma da Previdência em marcha forçada, por obra do amadorismo bisonho das não articulações do Governo na Câmara Federal, o que não é bom poderá ficar bem ruim e insustentável. E aí o país tornar-se-á imbatível e solitário em desigualdade econômica e social por décadas a fio. A democracia brasileira resistirá?


*João Correia é professor universitário e escreve todas as quintas feiras em ac24horas


 


 


 


 


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