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Amor com amor se paga

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Os dois acabavam de sentir o gosto açucarado da traição.


A lata de leite condensado ficou aberta na mesa da cozinha. No lado de fora da casa, amparados nos vasos de planta, a renúncia das primeiras vestimentas. Sobre o sofá, o restante das roupas que, por causa da indecisão avassaladora, não dava de saber se era dele ou dela. Já quanto à cama, mais parecia um celeiro de trigo após um forte furacão nos EUA nos meses de agosto.

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Cássio já tinha mais de dez anos de casamento com Greice. Já tinha passado por todas as fases possíveis do matrimônio: da novidade de uma dormida agarrada, ao engano de muitas vezes dormir na sala; dos ciúmes doentios dos primeiros anos, até os desprezos pela figura, e alegria quando sua esposa não estava em casa.


Achava que tudo isso era normal, mesmo tendo no peito uma sensação de que o casamento tinha lhe tirado uma vida mais solta e feliz. Revirando suas coisas velhas, tinha problemas ao ver sempre aquelas fotos com ela, pois sempre lhe saia da alma combustível para o barco do arrependimento.


 Isso lhe fazia mal. No espelho do banheiro, quando pensava essas coisas pensava também em outras duas agonizantes: estava ficando velho; não tinha aproveitado tudo que a vida lhe tinha reservado.


No trabalho, em conversa com os amigos, Cássio sempre dizia e afirmava que a traição era algo necessário e regular, substância fundamental na alquimia do convívio a dois. Mostrava convicção de que sem ela, não havia como temperar uma relação desgastada pelos anos, pela rotina e pelos cuidados dos filhos.


Algumas vezes fora aconselhado por Jean, seu Chefe, a frequentar os famosos encontros de casais, a fim de que, quem sabe, uma boa terapia pudesse tirar-lhe esses pensamentos e essas práticas reprovadas pela sociedade.


Mas não dava certo. Nada e ninguém conseguiam mudar sua opinião. Na sua cabeça, ele era apenas mais uma vítima das cargas hormonais e da química que produziram no homem essa tensão aturdida pelo sexo oposto. Não tinha culpa se, ao contrário das mulheres, não conseguia controlar e manter um casamento firme e honesto. Não tinha culpa se a sociedade pune com plumas a traição do homem e com chumbo a da mulher.


Os dois acabavam de sentir o gosto açucarado da traição.


A lata de leite condensado ficou aberta na mesa da cozinha de Jean. No lado de fora da casa, amparados nos vasos de planta, a renúncia das primeiras vestimentas. Sobre o sofá, o restante das roupas que, por causa da indecisão avassaladora, não dava de saber se era dele ou de Greice. Já quanto à cama, mais parecia um celeiro de trigo após um forte furacão nos EUA nos meses de agosto.


No taxi que lhe levaria para a conformidade da sua vida, depois das compras que não foram feitas, Greice sussurra baixinho no celular: “você hoje foi o meu limite”.


Vaidoso de si e de suas capacidades na cama, O Chefe de Cássio, propositalmente responde, fingindo desconhecer seus caprichos: “eu ainda não lhe mostrei nada”.

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Era prazeroso, pra ele, manter duas chefias. Sua única aflição era não ter certeza se era ou não vítima do leite condensado.


Por Francisco Rodrigues Pedrosa      f-r-p@bol.com.br


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