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O perigo mora ao lado

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Vizinhos… vizinhos, quando foi que inventaram essas pestes? Quando será que um dia nos livraremos deles? Se a maldade mora ao lado, então nunca deixaremos de tê-los ao nosso redor.


Há exceções! Claro! Mas as exceções apenas confirmam a regra: são, na maioria, umas pestes.

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Não é exagero meu! Se vasculharmos a história humana, nas figuras rupestres deixadas por nossos antepassados nas paredes de grutas escuras do mundo todo, podemos ver toda espécie de desenhos: veados, mamutes, nuvens, sol, estrelas, punhais, cerimônias, plantas, árvores, insetos, mas nunca, jamais, a imagem de um vizinho.


Desde os tempos mais remotos,  aprendemos que o homem é uma espécie, em sua essência, migratória. Como os outros bichos que buscam novos espaços, o ser humano provavelmente tenha saído da África e ganhado todo o globo, aclimatizando seus sonhos, desenvolvendo novas formas de vida e descobrindo diferente maneira de fazer bem sua passagem nesse mudo.


Mas há um detalhe que poucos exploram! Enquanto os outros avançam por novos horizontes por razões meramente biológicas e de subsistência, o homem percorreu longos caminhos, chegando aos confins do mundo porque queria se manter longe de vizinhos. Talvez uma luta em vão.


Seu Teixeira ficou sabendo que o morador da casa ao lado tinha comprado um sofá e que, quando chegasse, faria questão de que a Novena desse ano fosse na sua casa. Todos precisavam se acomodar no que havia de mais moderno no mundo das espumas, penas e almofadas.


Depois de quatro dias, o comprador foi à loja no intuito de saber o porquê da demora, sendo que o endereço era fácil de encontrar. Tudo bem que durante o dia ninguém ficava em casa, mas tinha combinado com o vizinho, Seu Teixeira, para que ele recebesse o móvel, já que sua mercearia só fechava lá pelas oito da noite, mais ou menos na hora em que Benedito chegava do serviço.


O motorista da entrega tinha tentado seis vezes achar o local. Quando perguntado acerca da residência do comprador, Seu Teixeira sempre dizia: não mora ninguém aqui no bairro com esse nome. E olhe que aqui no Vitória eu conheço até os ratos que já perderam o couro.


Depois de muitos “churumelos” e “greguelos”, ameaças de cancelar a venda, discussões e gritos, ficou acertado pelo gerente da loja que Seu Benedito iria junto com o motorista. “Vá lá” que perder trabalho não era muito bom, mas como a mulher trabalhava em casa de família, não tinha como se livrar de três aprendizes de capeta, para receber em casa a compra.


A chegada ao bairro foi triunfal! Quem via de fora, logo percebia que Seu Benedito e o motorista riam de algo muito engraçado. Na rua, como se fosse a chegada de um caminhão de sonhos, todos olhavam para a compra do vizinho, comentando a novidade. Apenas Seu Teixeira se mostrava frio, repetindo que ao invés do vizinho comprar móveis, deveria pagar suas contas que já aniversariavam.


Muitos foram ajudar a descarregar o produto, dando opinião para o melhor lugar, em um ardoroso debate sobre o local que o produto melhor combinaria com a televisão. Quem não se sentiu muito sujo pode até sentar para sentir a maravilha que era a compra de Benedito. Solucionado o problema, o sofá agora espelhava o sucesso e o conforto do cliente. Isso demorou uns dias apenas.


Na primeira ameaça de chuva, Seu Teixeira pagou um desses meninos que perambulam pelas ruas para que pudesse fazer uma arte delicada: quebrar as telhas da sala onde estava o sofá. Talvez o móvel recém-comprado precisasse de uma boa lavada.

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Quando Benedito chegou a sua casa à noite, lá estava o sofá todo ensopado, sujo com os resíduos que se desgrudaram das velhas telhas, encontrando canto certo no tecido do assento. Ficou horroroso.


Mesmo concertando a cobertura, na próxima chuva a mesma coisa: telhas quebradas e sofá encharcado. Devido a tanta agua que caia no inverno, o sofá não durou nem um mês direito. Logo se despedaçou e passou a servir de dormida para o cachorro da casa.


A próxima compra de Benedito foi um aparelho de DVD. Foi um sucesso! Foi ao Terminal, comprou uns DVs piratas na promoção e mudou suas noites. O “point” agora era trocar filmes e assistir os últimos lançamentos do cinema americano. Já nem lembrava mais do sofá!


Menos de uma semana, a polícia invade a residência de seu Benedito para apurar uma denúncia. Segundo informações de um anônimo delator, a casa dele era uma laboratório de fabricação de Cds piratas que abasteciam toda a cidade. Nada encontrado, a normalidade voltou ao seu trilho.


No outro dia, ao chegar a sua casa, Benedito encontrou-se no escuro. Alguém tinha denunciado o antigo gato que tinha feito por não ter conseguido pagar a conta de luz daquele mês. Passou a noite sem energia. Nem vela tinha comprado e infelizmente o vizinho não tinha no estoque, nem em casa para oferecer. As velas estavam todas escondidas numa caixa nos fundos da mercearia. Era uma pena.


No dia seguinte, os alimentos da geladeira davam sinais de que estavam com a validade comprometida. Por ser meio de mês, não tinha dinheiro para comprar tudo de novo. Além do mais, estava sendo difícil encontrar alguém que refizesse o gato.


Por trabalhar o dia inteiro, Benedito tinha pedido a Seu Teixeira que procurasse alguém que realizasse a operação. Como o vizinho, depois de um “enorme esforço”, não tinha achado ninguém para religar os arames. Seriam mais noites no escuro.


Dia depois, por sorte dos deuses, a mulher de Benedito tinha comprado um desses títulos de capitalização que o povo simples dá o nome de bingo, corretamente, e, no sorteio de domingo à tarde, era contemplada com um prêmio de alguns mil reais. Esse dinheiro serviu para trocar toda a mobília, arrumar a casa e pagar todas as contas que tinham. A felicidade tinha voltado ao lar. Parece!


O grande problema era que esse fabuloso prêmio não suportaria arcar com o que aconteceu. Por “acidente” o casal estava cedo em casa para assistir à dança sinistra das cinzas do que um dia tinha sido um lar. Seu Teixeira tinha colocado fogo na casa deles por pura inveja.


Choraram amargamente, desesperados e sem saber o que fazer. Tinham perdido tudo. Não havia saída.


Sorte deles que seu Teixeira apiedou-se dos desafortunados e cedeu uma casa sua que não estava alugada. A ajuda do bom vizinho não se restringiu a isso. Forneceu gratuitamente mercadorias para o amigo por mais de seis meses.


Era uma ajuda para que ele pudesse se reconstruir. Benedito também ganhou uma televisão velha, uns moveis usados e algumas roupas do homem que possuía uma bondade muito grande. Bastava apenas não querer caminhar do lado dele.


Era a prova mais clara de que há pessoas que convivem ao nosso lado e que precisam sempre se sentir as melhores. Tomemos cuidado com elas! Podem afogar nossos sonhos e serem as primeiras a buscarem, tardiamente, os salva-vidas.


Por FRANCISCO RODRIGUES PEDROSA      f-r-p@bol.com.br


 


 


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