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Os homens são fábricas de insegurança

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Depois do acontecido Guilherme deu mais valor à família. Percebeu que os anos que se portou de outra maneira não tinha sido o melhor modo de preservar seu patrimônio afetivo. Era ignorante, torto, grosso, medíocre e de um espírito mais mesquinho que a do mercador que agoniza pelas moedas que não recebe.


A vida inteira fez questão de mostrar que sempre o mando pertencia a ele. Era o capitão, uma espécie de cópia de homem que Kafka retratava em “Carta ao pai”.  Tudo passava por seu crivo, dois mais dois eram quatro só quando ele queria.

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A mulher era apenas algumas palavras, uma máquina de trabalho. Subjugada, massacrada pela autoridade do marido, Janete nunca teve vez e voz nessa união que se deu aos moldes tidos como antigo, mas que costumeiramente se mostra na tal modernidade.


Agora, tudo mudou!


Quarta feira tinha pizza e depois sorvete lá na Pinguim. Beijos eram usados para reparar pequenas manchas que ficavam nos lábios superiores devido à cor do açaí. A alegria da família era tal que as crianças poderiam até repetir as doses de mais bolas de sorvetes ou pedir “trident” na hora do pai pagar a conta.


Na quinta um cinema era a opção. Os dois filhos ficavam com a tia de Janete, para que o casal recém-reconstruído pudesse comentar na praça, sob a luz da lua, as cenas mais incríveis que aconteceram. Lembravam-se da infância, criticavam aquela desenvoltura do artista e não se esqueciam de que algumas vezes eles passaram por isso na vida.


Na sexta, Guilherme fazia um jantar sob a luz de vela e dizia a esposa o quanto a amava. Sobre um olhar puro e verdadeiro, ele reafirmava que aquela mulher era o amor da sua vida, a razão de sua existência, a causa de seu respirar.


No sábado era o churrasco na casa dos amigos. Amigos que não percebiam como um casal poderia se renovar daquela maneira. Chegavam sempre de mãos dadas. Intermitentes abraços apertados e beijos na nuca da esposa mostravam que ali havia um amor edificado sob a cumplicidade de dois que se queriam.


No domingo, bem cedo, já estavam os dois na Santa Missa, orando, pedindo e reconhecendo as falhas para com Deus. Diziam dos problemas do mundo, da maldade dos homens e da necessidade de buscarem uma fortaleza maior.


Os dízimos voltaram a ser ofertados. As ofertas passaram a ser mais generosas e pouco a pouco Guilherme já começava a falar para os presentes, dando pequenos recados e convites para que participassem dos encontros de casais aos sábados à tarde.


Esse ano parece que saíram de férias! Foram para Bahia, mais precisamente Porto Seguro, conhecer as maravilhas que a natureza deu a esse belo lugar. Conheceram Coroa Vermelha, Trancoso, Arraial D’ajuda, Praia do Espelho e à noite, de mãos dadas, passearam pela Passarela do Álcool. Tudo na mais perfeita união, na mais perfeita identidade conjugal.


Para Janete aquilo tudo era um sonho. De sapato velho furado a vestido do shopping Iguatemi, essa mulher sentiu o sabor de ser respeitada, amada, assistida e valorizada. Por tudo que estava vivendo, imaginou ser a pessoa mais feliz do mundo.


Se soubesse que esse paraíso amoroso existia, teria desejado aquilo antes. Sexo nunca foi muita coisa em sua vida. Preferia um abraço apertado, um reconhecimento da mãe que tentava ser e da esposa que sempre se esforçava para demonstrar.


A disfunção erétil de Guilherme salvou seu casamento, mudou sua vida e foi capaz de lhe fazer compreender a joia que estava a seu lado, diamante que amargou tantos anos sua indiferença, que se escondeu na lama de sua incompreensão e machismo.


Broxa, incapaz de responder aos delírios mentais dos homens, Guilherme não era mais nada na cama. A noite ao deitar tinha medo. Medo que se transformaria em choro, se a mulher não lhe abraçasse forte e dissesse que ele era o amor de sua vida.

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Infeliz com o peixe, satisfeito com o gato, Guilherme tornou-se um grande homem na vida. Isso era o mais importante. Esse era o maior valor, a mais perfeita harmonia matrimonial.


Qualquer necessidade que ela sentisse, sabia como resolver. Afinal, era apenas resposta a instintos naturais que não afetavam sua relação com seu grande amor. Os braços de outros homens não tiravam sua alegria de ser uma família feliz, como também não tinham sido capaz de deixar o lar menos triste, quando era ele que vivia em outros braços femininos sua fase áurea.


Tudo no mundo é frágil, tudo passa…


Quando me dizem isto, toda a graça


Duma boca divina fala em mim! (Florbela Espanca)


FRANCISCO RODRIGUES PEDROSA   f-r-p@bol.com.br


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