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Inconsciente coletivo, forças sistêmicas e a indicação de Alexandre Moraes para o STF

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*Luciano José Trindade


*Luciano José Trindade

Muitas vezes quando falamos de temas como “inconsciente coletivo” ou “forças sistêmicas” da sociedade, surge um ponto de interrogação no semblante das pessoas e elas até riem, achando que é algum tipo de brincadeira, uma pegadinha. Podemos exemplificar o inconsciente coletivo e as forças sistêmicas com uma questão atual: A polêmica indicação de Alexandre de Moraes para o STF.

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Mas, afinal, o que são “inconsciente coletivo” e “forças sistêmicas”?


Segundo Carl Gustav Jung, inconsciente coletivo é o conjunto de sentimentos, pensamentos e lembranças compartilhadas por toda a humanidade. Usando uma imagem simbólica é como uma nuvem formada por todas as práticas, experiências, ações, vivências e pensamentos de cada indivíduo e de toda a humanidade.


Cada atitude, palavra ou pensamento humano, seja de amor ou de ódio, de prosperidade ou de miséria, de algum modo se liga a essa nuvem de informações. Isso explica, por exemplo, a atração irresistível que a maioria de nós tem por vídeos, filmes e programas de luta, pois somos influenciados pelo conjunto de informações sobre guerras, lutas e outras formas de violência já praticadas na história da humanidade. E, de igual modo, cada vez que nos expressamos através da violência ou assistimos e compartilhamos vídeos violentos, acabamos por fortalecer essas informações, retroalimentando o inconsciente coletivo que influenciará as gerações futuras.


É certo que não somos resultado apenas do inconsciente coletivo. Somos diferentes uns dos outros por uma série de outros fatores, tais como genética, informação do campo ancestral, contexto social, experiências vividas, etc. Mas não há dúvida que o inconsciente coletivo é um fator importantíssimo de influência no comportamento de cada pessoa. Em síntese, o inconsciente coletivo é o campo de informação que liga o indivíduo e a humanidade, que estabelece a interdependência entre a parte e o todo.


E as forças sistêmicas da sociedade são todo o contexto social precedente que nos trouxe até aqui e fez com que sejamos exatamente como somos. Cada pessoa é inconscientemente leal ao seu contexto sistêmico, formado por todas as diferentes informações de seu passado: tanto do inconsciente coletivo quanto genéticas e do seu campo familiar ancestral, do contexto social onde cresceu e das experiências que viveu.


Então ao observar o inconsciente coletivo e as forças sistêmicas hoje vigentes na sociedade brasileira, fica claro porque Michel Temer indicou Alexandre de Moraes para o STF: simplesmente é uma lealdade ao modelo de indicação política que desde sempre imperou no país.


No caso vemos que apesar do indicado ter a qualificação técnica necessária para o cargo, outros aspectos tais como o seu envolvimento político-partidário, os cargos políticos que recentemente ocupou e as atividades privadas que desempenhou são fortes razões para questionar e até duvidar se terá a necessária imparcialidade, decoro, comedimento e temperança como ministro do STF. Por isso são compreensíveis as alegações de que, nesse momento, Alexandre de Moraes não poderia ser indicado para o STF.


No entanto, se essas regras de fato fossem seguidas em nossa sociedade política, então também não teria sido indicada a esmagadora maioria dos juízes, desembargadores e ministros que nas últimas décadas foram nomeados por presidentes da República e governadores de Estados para os mais diversos tribunais do país (TJ’s, TRE’s, TSE, TRF’s, STJ, STF…).


O que estamos dizendo é que não há diferença substancial na indicação de Alexandre de Moraes com a maioria das que ocorreram antes. Teoricamente todos sabemos que o envolvimento ideológico-político-partidário e a prévia atuação do nomeado na defesa de interesses do nomeante deveriam ser consideradas como razões suficientes para impedir que a pessoa fosse indicada para o Poder Judiciário. No entanto, também sabemos que na prática não é isso que ocorre. As regras implícitas e as forças ocultas que tem sustentado nosso sistema são exatamente o contrário disso. Quanto mais se é próximo e comprometido com o responsável pela indicação, mais chance se tem de ser indicado.


É por isso que somente através de um olhar sistêmico podemos compreender que a indicação de Alexandre de Moraes ao STF é perfeita e normal, pois no estágio de consciência coletiva em que nos encontramos não teria como ser diferente.


Talvez inconscientemente seja aceita uma influência mais profunda da legitimidade política, advinda do voto popular, permitindo que sejam indicadas para o judiciário pessoas que tenham práticas, valores, ideologias e perfis semelhantes e comprometidos com o representante político que os indica e nomeia. Nessa hipótese, em última análise, vão para os tribunais juízes, desembargadores e ministros com perfis político e ideológico semelhantes àqueles escolhidos pela população majoritária.


O que importa saber é que esse modo de indicação de membros do judiciário se fortalece a cada nova nomeação e, implicitamente, passa a ser considerado normal e admissível, ainda que siga o modelo das livres nomeações políticas e das composições representativas do Estado e de organizações de classe, onde geralmente o mérito e a qualificação técnica tem menor peso que a governabilidade, o ganho político e a afinidade com a autoridade responsável pela escolha.


E é óbvio que isso não ocorre apenas na escolha final do magistrado pelo presidente da República ou governador do Estado. De forma semelhante também são compostas as listas sêxtuplas e tríplices para escolha dos representantes do quinto constitucional no Poder Judiciário. Queremos ter no Judiciário um magistrado que nos seja simpático, que saiba que chegou lá muito por causa de nosso apoio, que tenha conosco canal direto de interlocução…

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A realidade é que independentemente do espírito ideal da Constituição e das leis, a organização política da sociedade se materializa de acordo com essas regras e forças sistêmicas ocultas, alimentadas por um inconsciente coletivo secular, tão forte que mantém a todos leais ao sistema. É por isso que mesmo alguém que faz críticas e alega que os outros estão fazendo algo errado, acaba não tendo força para fazer diferente daquilo que criticou. É que a ignorância sobre a influência do inconsciente coletivo e das forças sistêmicas impede que a pessoa tenha consciência de quanta coragem e humildade é necessária para fazer diferente daquilo que tem sido feito. E então aquela boa intenção individual acaba isolada, distante aniquilada. Essa é a imagem comum nos dias atuais, onde todos sabem o que é certo, mas ninguém parece ser capaz de fazê-lo.


Exceções existem, claro. Sobral Pinto, reconhecido como o maior dos advogados contra a ditadura militar, defendeu Juscelino Kubistchek para que pudesse tomar posse como Presidente. Depois, quando JK quis indicá-lo a ministro do STF, Sobral Pinto recusou, pois entendeu que caracterizaria privilégio e recompensa indevida. Quanta força e integridade interior teve esse homem. Muito mais difícil que enfrentar a violência física e psicológica da ditadura, revelou-se um gigante ao manter a autonomia de sua consciência e a integridade de seus valores quando confrontado pela sedução do poder e da vaidade.


Fora casos raríssimos como esse, a imensa realidade é outra. Vive-se na mais absoluta falta de integridade interior entre o que se pensa/fala com o que se faz. Por todo lado vemos exemplos de como conquistar e manter o poder político. Raros são, no entanto, os exemplos de integridade interior, de capacidade de ser e fazer diferente, de coragem e humildade para vencer as forças sistêmicas ocultas e o inconsciente coletivo baseado na regra de que os fins justificam os meios.


A propósito disso, Sartre dizia que nós sempre estamos diante de questões existenciais e que são nossas escolhas diárias que determinam nossa realidade. Tomando isso como lição, fica evidente o nível de inconsciência das pessoas que julgam e criticam ferrenhamente determinadas situações sem perceber que aquilo que combatem na verdade é fruto de suas próprias posturas, pensamentos e atitudes anteriores.


No caso tomado como exemplo, incrível como pessoas que agora criticam a indicação de Alexandre de Moraes, nenhuma crítica fizeram ou até elogiaram a indicação de Dias Tofoli ao STF. Não percebem que aquela indicação contribuiu para o fortalecimento do inconsciente coletivo e das forças sistêmicas ocultas que agora autorizam a indicação de Alexandre de Moraes.


Esse é um belo exemplo do nível de esquizofrenia e inconsciência do comportamento da nossa sociedade pós-moderna. Supostamente somos racionais e veneramos a ciência, porém nos limitamos aos conhecimentos mecânicos, estanques e ultrapassados. Hoje a ciência mais avançada (física quântica, neurociência, campos mórficos de Rupert Sheldrake, etc), demonstra claramente o efeito não local da ação e da observação, que o comportamento individual e coletivo é determinado preponderantemente pelo cérebro emocional e pelas memórias inconscientes e que há real interdependência entre sujeito/objeto, entre intenção/realidade e entre contexto sistêmico-/vida experienciada.


Já não se pode ignorar que do mesmo modo que nosso corpo e nossa saúde física são resultado direto dos alimentos que ingerimos, também as nossas dimensões mental, emocional e relacional resultam das informações e das experiências mentais, emocionais e relacionais que alimentaram e alimentam tanto o inconsciente individual quando o inconsciente coletivo.


Há um ditado popular muito verdadeiro segundo o qual os filhos fecham os ouvidos para os conselhos e abrem os olhos para os exemplos. Nesse mesmo sentido, nossa realidade individual e coletiva é construída diariamente por aquilo que realmente fazemos, não por aquilo que julgamos errado nos outros. Então, mais importante do que defender ou criticar o nome indicado ao STF, para cada um de nós fica o questionamento sobre qual tem sido nossa escolha existencial quando somos os protagonistas ? para além das palavras, críticas e discursos sobre o que é certo ou errado e o que os outros deveriam fazer, quais são efetivamente as nossas práticas ? que realidade queremos erigir para nossa vida e nossos descentes ? O que realmente estamos dispostos a defender em qualquer situação, independentemente do cargo ou posto que ocupamos ou dos ganhos que podemos ter? Qual a nossa integridade interior de pensamento, posicionamento e atitudes ?


Mais importante que Dias Tofoli e Alexandre de Moraes serem ministros do STF, faria toda diferença se tivéssemos consciência que nossa realidade existencial é construída pela decisão diária daquilo que fazemos e quais valores defendemos. É nossa responsabilidade escolher o tipo e a qualidade das informações que vamos produzir para retroalimentar o inconsciente coletivo, para fortalecer a regras sistêmicas e construir do futuro. Esse é o encontro marcado e inevitável que temos conosco mesmos e com as próximas gerações.


Luciano José Trindade é Advogado, Constelador Sistêmico Familiar/Organizacional e Terapeuta de Alinhamento Energético.


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